Por Ramon Rapallo e Leandro H. dos Santos
Fato veio a público após publicação de carta da associação Nossa Mariana ao Movimento Renovador de Mariana, que viralizou nas redes sociais nos primeiros dias de abril de 2025 e provocou intenso debate na cidade.
A polêmica iniciou-se após a divulgação de um ofício, no qual o Presidente da Casa de Cultura de Mariana, Sr. José Benedito Donadon Leal, informa em fevereiro, por ofício, a Vânia Maria Santos, Presidente do Movimento Renovador de Mariana, que a Casa de Cultura está em processo de implantação de uma reforma administrativa, para adequar-se as leis vigentes, de acordo com as determinações legais que regem as instituições de cultura.
Neste ofício o Sr. presidente informa existir a proibição legal de coexistir dois CNPJ ( cadastro nacional de pessoa jurídica) funcionando no mesmo espaço. O presidente determina que as associações que funcionam dentro da Casa de Cultura passem a ser departamentos, porém sem CNPJ . Tal ação permitirá que as associações continuem a exercer suas funções normalmente como já fazem.
No oficio dirigido ao Movimento Renovador, o presidente informa as novas condições e adequações necessárias para continuar o uso da Casa de Cultura, e que uma delas é que seja transformado em ” Departamento ” para poder continuar funcionando conjuntamente no mesmo espaço.
No final do Oficio o presidente afirma que caso o Movimento Renovador não aceite ser um “departamento” da casa de Cultura” e dar baixa no seu CNPJ, perderá o direito de usar as dependências da Casa de Cultura para suas atividades. Posteriormente foi dado prazo até dia 31 de dezembro de 2025.
No seu argumento o Presidente da Casa de Cultura afirma que as duas entidades, ou mais, funcionando juntos poderia haver conflito de interesse ou uso indevido de marcas.
Mediante a esse fato a associação “Nossa Mariana” publicou uma carta nas redes sociais, sobre o Movimento Renovador, afirmando que o mesmo existe desde 1980 funcionando na Casa de Cultura, e também afirma que além de morador, dá vida ao espaço. Na carta da Associação Nossa Mariana cita também a relação de harmonia desde a fundação do Movimento Renovador e Casa de Cultura, citando o ex-presidente da Casa de Cultura e ex-prefeito de Mariana Sr. Roque Camello, que sempre zelou pela coexistência e parceria das duas entidades, por mais de 30 anos enquanto esteve a frente da instituição. A
Associação Nossa Mariana classificou as ações citadas no ofício como ” tentativa de despejo forçado”, ainda com a sugestão que encerre seu CNPJ.
A carta pública divulgada pela associação Nossa Mariana foi amplamente compartilhada por artistas, intelectuais, ex-integrantes do Movimento Renovador e membros da sociedade civil, reacendendo discussões sobre a autonomia das entidades culturais da cidade e o direito ao uso democrático dos espaços públicos. Alguns acadêmicos se manifestaram publicamente sua posição, como Ângelo Oswaldo que é filiado a Academia Marianense de Letras, ligado a Casa de Cultura.
No centro da polêmica estava também uma convocação de reunião para aprovação do novo estatuto da Academia Marianense de Letras, enviado via e-mail para os acadêmicos no dia 01 de abril de 2025, para sua votação dois dias depois (03 de abril).
A proposta de um novo estatuto causou surpresa e espanto em alguns acadêmicos, pois estes não sabiam de sua elaboração.
O texto do novo estatuto incluía, entre outras propostas, a cláusula que determinava a retirada das associações que não atendessem a nova regra. Como Movimento Renovador da Casa de Cultura não aceitou a cancelar seu CNPJ poderia ser convidado a retirar-se se a modificação fosse aceita.
Durante a reunião após vários questionamentos a votação do novo estatuto foi suspensa. No entanto, após comoção de muitos, foi solicitado um levantamento dos votos dos acadêmicos revelando que a maioria destes era contrário ao novo estatuto apresentado pela diretoria, o que impediu, ao menos por enquanto, a saída do Movimento Renovador.
O resultado da votação foi recebido como uma vitória parcial pelos defensores do Movimento Renovador de Mariana.
O Prefeito de Ouro Preto, Sr. Angelo Oswaldo, que é membro da Academia Marianense de Letras se manifestou. Veja carta:
” Senhor Presidente Donadon Leal; Como membro da Academia Marianense, chamado pelo fundador, o saudoso Waldemar de Moura Santos, venho manifestar o meu voto contrário às alterações no Estatuto e no funcionamento da nossa entidade, bem como na gestão da Casa de Cultura de Mariana, instalada pelo também saudoso governador Israel Pinheiro.
Eliminar o Movimento Renovador de Mariana do Estatuto e dos espaços da instituição é um ato que fere, brutalmente, os ideais e propósitos, os programas e atividades, a trajetória e a finalidade da Academia e da Casa de Cultura.
Se isso for consumado, quero antecipar a minha decisão de afastar-me da Academia e da Casa de Cultura enquanto perdurar a atual gestão diretiva, no aguardo de eleições que possam restabelecer, na condução da entidade, um pensamento concorde com as metas culturais e democráticas que nos inspiram, ora confrontadas.
Estes são o meu voto e a minha posição.
A fim de reitera-los, enviei procuração ao ilustre Prof. Moacir Castro Maia, solicitando-lhe que apresente, pessoalmente, o meu voto, pelo que me manifesto pela via eletrônica e pelo voto direto. Atenciosamente, Ângelo Oswaldo de Araújo Santos “ Fim da carta.
Enquanto isso Movimento Renovador de Mariana, em nota, agradece o apoio, e reafirma seu compromisso com a cultura crítica e independente, celebrando seus 38 anos de existência e resistência.
Análise do fato :
Uma associação cultural que tem CNPJ pode decidir por ela mesma, fazer parcerias, decidir promoções de eventos e receber e ordenar pagamentos. Sem CNPJ essa associação estaria ligada a uma outra organização que a controla, perdendo assim sua autonomia para assinar contratos, propor e realizar despesas sem aval da organização que a representa.
Por um lado essa centralização num só CNPJ simplificaria a gestão cultural, prestação de contas e busca por recursos, por outro as associações perderiam sua autonomia para se auto gerir o que poderia influir na sua continuidade.
Por exemplo, no dia 12 de março de 2025 o Movimento Renovador de Mariana recebeu verba da Cedro Mineração de 100 mil reais para execução de projetos. Se as mudanças fossem aprovadas esse contrato teria que ser entre a mineradora e a Casa de Cultura, que então passaria a ser gestora do contrato.
O que pesou mais na proposta foi a forma da apresentação: excluindo quem não concorda com as mudanças do estatuto do espaço da Casa de Cultura, que há anos diversas associações ocupam, relacionam-se e convivem com a comunidade. Isso fez que acadêmicos rejeitassem a mudança no voto, provando também que a gestão atual preza pela gestão democrática.
Fonte : Jornal O Espeto